Privatizações na Petrobras: alta dos combustíveis, precarização e prejuízo estatal

Privatizações na Petrobras: alta dos combustíveis, precarização e prejuízo estatal

Para Guilherme Estrella, geólogo responsável pela descoberta do pré-sal, investidores “não têm nenhum compromisso com o Brasil, nem com o povo brasileiro”

Rlam, refinaria vendida no processo de privatização da Petrobras

A Refinaria de Mataripe, antiga Rlam, vende os combustíveis mais caros do país após a privatização (Foto: Sindipetro Bahia)


por José Eduardo Bernardes, especial para o Petroleo dos Brasileiros | Edição: Guilherme Weimann

Enquanto diversas nações pelo mundo se vêem em uma encruzilhada pela alta dependência de combustíveis fósseis e buscam alternativas reestatizando empresas e revendo contratos, o Brasil tem optado por se desfazer de suas refinarias de petróleo.

Desde o governo de Michel Temer (MDB), o plano de privatizações da Petrobrás se intensificou: a estatal pretende se desfazer de 8 das suas 13 refinarias. Os custos dessas operações, no entanto, já têm revelado seus efeitos.

Durante o período de alta desenfreada dos combustíveis, em julho deste ano, os postos ligados à antiga BR Distribuidora, privatizada pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) em junho de 2021, foram os que apresentaram a gasolina mais cara em São Paulo e em outras sete capitais brasileiras.

A antiga Rlam (Refinaria Landulpho Alves), agora Refinaria de Mataripe, sediada na Bahia e única empresa de refino que teve seu processo de privatização concluído até o momento, também mantém preços mais elevados do que o mercado nacional, apesar da queda artificial de preços promovida pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) às vésperas do período eleitoral.

A proprietária da Refinaria de Mataripe, a Acelen, comandada pelo grupo Mubadala dos Emirados Árabes, divulgou que o preço da gasolina A teve alta de 9,7% em outubro. Já o diesel S 10 foi reajustado em 11,3% e o diesel S 500 foi reajustado em 11,5%.

Política de preços

O geólogo e ex-diretor de Exploração da Petrobrás, Guilherme Estrella, que esteve à frente da descoberta do pré-sal, acredita que o processo de privatização da estatal está intrinsecamente ligado ao Preço de Paridade de Importação (PPI), que equipara os preços do petróleo no Brasil aos praticados no mercado internacional.

“Os investidores estrangeiros só vêm para o Brasil se nós praticarmos o preço internacional do petróleo. Eles são estrangeiros, eles não tem nada a ver com o Brasil, não tem nenhum compromisso com o Brasil, nem com o povo brasileiro. Então para que a refinaria baiana tivesse comprador estrangeiro, o governo brasileiro igualou os preços do combustível no Brasil aos preços internacionais”, aponta.

Desde 2015, a venda de ativos da estatal já acumula R$ 263,4 bilhões, segundo levantamento do Observatório Social do Petróleo (OSP). Nesta conta estão as privatizações de campos de petróleo, refinarias, gasodutos e grandes subsidiárias, como a BR Distribuidora.

O principal objetivo das privatizações, segundo a empresa, é concentrar investimentos na exploração e produção do pré-sal, e diminuir sua dívida ativa, que fechou 2021 em R$ 299,5 bilhões. No entanto, somente no segundo trimestre deste ano, a empresa pagou R$ 87,8 bilhões em lucros e dividendos aos acionistas.

Os prejuízos, no entanto, não aparecem apenas diretamente no bolso dos consumidores que pagam valores ainda maiores no preço dos combustíveis.

Vendas subvalorizadas

Um estudo publicado recentemente na revista Oikos, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), por André Ghirardi, professor da Universidade Federal da Bahia e ex-assessor da presidência da Petrobrás entre 2005 e 2015, aponta que a venda da Rlam teve preço muito inferior ao seu valor real.

Quando concluída a venda da refinaria, em dezembro de 2021, o valor arrecadado pela estatal foi de US$ 1,65 bilhões. Para Ghirardi, o valor seria quase três vezes maior do que o registrado.

“[No estudo] eu encontrei um valor de US$ 3,8 bilhões. Se você levar em conta as imprecisões que essas estimativas necessariamente têm, pode-se dizer US$ 4 bilhões. A refinaria foi vendida num valor muito inferior ao que seria o valor de mercado”, explica Ghirardi.

A privatização, segundo o professor, “revela uma intenção da Petrobrás de se desfazer das refinarias, ou de alguma forma, se desfazer da posição da Petrobrás no mercado de refino a qualquer a qualquer custo”.

Precarização do trabalho

O ex-diretor de Exploração da Petrobrás, Guilherme Estrella lembra que os trabalhadores da antiga Rlam, e de outras refinarias que estão na lista para serem vendidas, também sentem os efeitos negativos das privatizações.

Após o acordo de venda da refinaria baiana, a estatal deu três opções aos trabalhadores: realocação interna, Plano de Demissão Voluntária (PDV), com prazo de 45 dias para adesão, e o Plano de Demissão Acordada (PDA).

“No Rio Grande do Norte, tínhamos descoberto um campo em águas profundas. Tudo isso acabou. E eu estive lá conversando com as pessoas, as pessoas estão encostadas aguardando o processo de demissão voluntária e de transferência para outros estados”, aponta Estrella.

“O engenheiro que era gerente geral no Rio Grande Norte, da área de exploração e produção, hoje é funcionário embarcado do campo em Macaé. Ele tem que ir e voltar. Ele saiu de um cargo de gerência regional para ser um engenheiro numa plataforma. É uma diminuição da qualificação dos empregados”, completa Guilherme Estrella.

Segundo a Federação Única dos Trabalhadores (FUP), até 2020, houve redução de 65% no número de trabalhadores próprios da Petrobrás nas regiões Norte e Nordeste. Já no Sudeste, a queda foi de 26%. Entre terceirizados, foram mais de 22 mil empregos, o que significa uma redução de 48% dos postos de trabalho.

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